Chega a hora de jantar e os ponteiros
acelerados caminham para as oito horas da noite. Eu não. Em jeito de passeio de
domingo, caminho tranquilo pelo cais, rumo ao meu local de trabalho. Persiste o
cheiro a peixe no ar, embora o cais vestido de cimento nada denuncie. Ainda
tenho tempo antes de embarcar. Sento-me nas escadas e olho para a Luís Adrião. Começo a tentar imaginar a
noite de faina que poderei ter. Há o reconhecimento da incerteza e da incógnita
que cada dia nos traz. Recordo antigas pescarias e estórias que cada tábua pode
partilhar. Embarco. Uma noite no beliche. O motor é a minha música de elevador. Está calor,
muito calor. O odor do gasóleo toma conta da atmosfera e mistura-se com o da conserva que um camarada janta a estocadas de navalha. Com mais uma
corrente de ar, contemplo um nevão de escamas perdidas. Adormeço. A noite passa. O sol
rasga a terra. Acordo. A rede sai. A cavala entra.
Incógnita
(Text & Photo - Luís Pinto Carvalho - All Rights Reserved)